O BarbeiroAntónio Augusto Francisco perfez em Março passado a bonita idade de cinquenta anos
de profissão, facto a registar e oportunidade para uma conversa sobre uma actividade tão
enraizada nas vivências do nosso povo—a de BARBEIRO.
O António teve como Mestre o Augusto Sirinéu, numa altura em que o período de
aprendizagem era de dois anos, naturalmente sem remuneração embora sempre aparecesse
uma “recompensa”, mas ele ficou-se pelos dezoito meses dado que comprou a oficina quando
o “mestre” foi para o Brasil.Situava-se a mesma na Rua da Misericórdia, junto à “pedra da
miséria”,e foi daí que mais tarde transitou para a Rua do Comércio ( 1969) onde ainda hoje se
encontra, depois de uma curta ausência na Bélgica o que, segundo nos diz ,socialmente o
marcou.
Mas como se processava essa aprendizagem?
Antes de mais, o varrer da casa era com o aprendiz, que pouco a pouco ia aprendendo as
diversas funções como colocar o pano para fazer a barba, colocar o pano para cortar o
cabelo,e fortalecendo o pulso abrindo e fechando a chamada máquina de quatro zeros.
Mais material necessário ( ente outro; claro):a cadeira( a então famosa marca A. Pessoa),a
navalha, o”assentador para a afiar a mesma, o pente ,uma cabaça para o álcool e outra para o
pó de talco, o espelho fixo na parede e de frente à cadeira e o outro pequeno para que
colocado por detrás da cabeça se pudesse ver como o mesmo estava, o pincel e a respectiva
taça, uma pequena escova…
Havia ainda a cadeira de madeira onde os aprendizes começavam e se cortava o cabelo às
crianças.
Nessa altura havia as categorias de “aprendiz” e de “mestre”enquanto hojenesta como
noutras profissões se geralizou as de formando ou praticante e formador….
Cabelo ou Barba ,qual o trabalho mais difícil?
O cabelo exigia mais arte, mas para a barba era preciso conhecer a navalha, aí residindo o ter
mais ou menos fregueses. Enquanto hoje a navalha tem uma lâmina que ao partir-se se
substitui, naquele tempo não era assim.E quanto mais suave fosse o fazer da barba…
Entretanto, rapada a cara…[URL=https://s606.photobucket.com/albums/tt144/linomendes/?action=view¤t=cadeira-1.jpg][URL=https://s606.photobucket.com/albums/tt144/linomendes/?action=view¤t=cadeira-1.jpg]
Havia que desinfectar ,para o que havia o “álcool”que no entanto e como alguns diziam
“picava” um pouco pelo que preferiam o “sublimado”,este a comprar na Farmácia em forma
de comprimido, onde só era vendi do aos donos das barbearias. Após o que se passava ainda a
“pedra-pomes”que estava colocada num pequeno recipiente juntamente com o “lápis” para
parar o sangue quando disso era caso.
Nessa altura, o custo da barba era dez tostões (1$00) e do cabelo três e quinhentos (3$50).
As barbearias eram muitas?Sim,e começando pelas Afonsas tínhamos o RAPOSO(que até tocava concertina),o ZÉ
DA BARRACA, o BOTTO, o PAILÓ,O ZÉ TRINDADE, o MANUEL AIROSO, o ANTÓNIO DO
CAFÉ, o CAVACO o ZÉ DE VISEU…
E, claro, ele. E ainda os que trabalhavam nos Foros do Mocho, em Vale de Vilão e
Farinha Branca. Anteriormente, recordo-me ainda do RASCÃO, do ZÉ CARDOSO e do
JAIME.
Mas a verdade é que havia muito serviço…Havia mas ao fim de semana, e em datas como a Feira, o Natal, a Páscoa, o Carnaval, alturas de festa em
que inclusivamente colegas de Cabeção nos vinham cá ajudar. Depois eu e o meu mestre retribuíamos por
altura dos Passos que levavam muita gente e Cabeção.
Recordemos entretanto que o descanso era à segunda-feira, só passando para o domingo depois de uma
petição feita ao Dr:Manuel Fernandes, então Presidente da Câmara.
Mas falemos então do “corte de cabelo”
Se fosse hoje tudo seria mais simples já que a juventude não é exigente, por vezes qualquer corte de cabelo
serve. Mas naquele tempo, havia o “guarda lama”junto às orelhas que tinha que ficar fechado ,assim como
o “disfarce” no pescoço, mais difícil que o “vincado”.Diga-se, entretanto, que ainda hoje quando se dá
formação a e se abordam os métodos básicos para execução do corte de homem, merecem destaque “ as
técnicas de contorno e disfarce de nuca e patilhas”.
Nessa altura pedia-se em especial o “caldinho” e o “risco ao lado”,não se usava o cabelo penteado para
trás. Usava-se então a “brilhantina” para dar brilho ao cabelo, e o “fixador”para o fixar”, em especial
quando algum era espetado à sivela como então se dizia.
O cliente gostava também muito de cheirar bem ,e para isso tínhamos a “àgua de cheiro” e a “àgua de
colónia”
Olhando então em redor constatei que as paredes e da oficina estão cheias de diplomas de “formações” que
o António Augusto frequentou, e de fotografias com diversos cortes de cabelo, certamente , pensei eu,para o
cliente escolher .Mas que nada disso pois que o corte que dá para um cliente pode não dar para outro. Cada
cabeça é um caso para o que têm a ver vários factores, como a configuração dos ossos da cara e até , a
maneira de vestir e de andar.
Em que altura é que as mulheres começaram a cortar o cabelo nas
Barbearias?Quando comecei a trabalhar o meu mestre já cortava o cabelo a mulheres, acontecia até que as “do campo”
vinham à noite cortá-lo…
Possivelmente era quando podiam…Nada disso, era para não serem vistas ,e regressavam a casa de lenço na cabeça. É que quando viam as da
vila caminhar para a barbearia, chamavam-lhe um certo nome..E o curioso é que quando se juntavam na
loja davam-se muito bem, mas depois cá fora é que era…
E atenção que nos anos 60 já por aqui havia mulheres e mesmo homens que pintavam o cabelo—e
mostrou-me o recipiente para a tinta. O trabalho era até feito numa outra sala, lá para o fundo.