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     A RURALIDADE NA ESCRITA

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    linomendes




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    Data de inscrição : 16/06/2010

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    MensagemAssunto: A RURALIDADE NA ESCRITA   A RURALIDADE NA ESCRITA Icon_minitimeTer Ago 23, 2011 8:29 pm

    POR: ANACLETO PIRES MARTINS

    “Estudos de Castelo Branco”-nº6 - Dezembro de 1981

    Photobucket


    Presa de Alcaravela, foi a aldeia em que nasci, há já passante de um moio de anos - lugar administrativamente ligado ao Ribatejo, mas geográfica e socialmente beirão. É uma região pobre. Para mais, há sessenta anos, a sua riqueza relativa - o pinhal - mal começava a ser aproveitado. Assim, a maior parte dos seus habitantes vivia dependente do dinheiro que, ciclicamente, ia buscar à “Ceifa” e à “Azeitona”.

    O “Tio Daniel”, da “Loja”, ia fiando e aquela gente, pobre mas honrada, em geral, não o deixava ficar mal. Quantas vezes tudo ou quase tudo o que se ganhava, era afogado a pagar as contas em atraso.
    Photobucket
    A ceifa, sobretudo, era a esperança de equilíbrio daqueles orçamentos bem modestos. Era pena que obrigasse a migrar. O afastamento da mulher e dos filhos pequenos, a interrupção do “derriço” ou namoro, para os mais novos, a ausência do noivo que tantas vezes, aguardava o dinheiro da ceifa para as últimas compras do reduzido enxoval - eram o senão daquela esperança.



    Mas a ceifa tinha outro aspecto muito positivo, além do económico - concretamente para os jovens. Era a ocasião de um confronto competitivo, não à base do desporto, que não havia, mas do trabalho - competição psicologicamente necessária, esta ou outra, para que o jovem se possa rever naquilo de que é capaz.

    Ir à ceifa representava, só por si, o sair do mundo infantil, deixar de ser a criança, a quem não se passa cartão, para entrar no mundo dos adultos.

    A ceifa era, assim, desejada não só pelo aspecto económico ou ainda porque, para muitos (e eu estava nesse número), correspondia a calçar as primeiras botas e a ter uma série de objectos, de uso pessoal, até aí impensáveis, mas, sobretudo, porque, no caso concreto dos jovens, vinha responder a uma secreta, muito íntima, necessidade de romper com as fronteiras de um mundo demasiado acanhado e de dar expressão ao espírito de aventura que dorme no coração de cada adolescente. O gosto da afirmação, pela competição que, nos tempos medievais, explicava os “torneios” com que, habitualmente, se antecediam à “investidura” dos cavaleiros (e não só), ficou na alma do povo, ou melhor, esteve sempre na alma do povo e se, na idade média, se manifestava no terçar das armas pela sua”Dama”, para os jovens do meu tempo e da minha zona e condição, era, no aguentar do trabalho e deste trabalho concreto da ceifa, neste aguentar firme na linha do “corte” e no alargar do espaço varrido pela foice, que surgia a ocasião propícia para a sua afirmação real e promoção social.



    Havia uma “escala” que importava subir, não aos olhos da “Dama”( e, de algum modo, também, porque a namorada, a irmã ou a mãe acabavam por acompanhar e estar normalmente presentes naquela escalada), mas aos olhos dos “camaradas” - termo, nessa altura, limpo de qualquer carga de sentido político.

    Eles seriam árbitros quase sempre justos, daquela competição e, até, porque não se ia à ceifa, em geral, isolado. Estava o pai, o irmão mais velho, o tio ou, ao menos, um vizinho que “apadrinhava” o jovem.

    A “escalada” tinha a sua praxe e, só em casos especiais, sempre justificados, se não respeitava.



    De “novel”, a começar, subia-se a “sobre-novel”. Depois, a passagem a “corte” e à “soldada”, conforme o trabalho produzido o ia justificando e, por fim, a subida ao último escalão geral - “camarada”, pagando-se, no primeiro ano, a “patente”, ou se o jovem em causa assim o preferisse, ficava-se pelos “meios interesses” - que correspondiam a metade do ganho ou importância registada entre a “soldada” e a verba atribuída aos camaradas. Também o ser escolhido para “ponta” direita ou esquerda, representava distinção - pedia-se-lhe mais esforço, correspondia-lhe especial retribuição.

    Era todo um ritual que se respeitava religiosamente, em que se pressentia algo da “consagração” das medievais “investiduras” dos “Cavaleiros”.

    Também eu fui à Ceifa. Recordo hoje, com extraordinária emoção, o entusiasmo com que preparava as “as armas” que utilizaria neste singular “torneio”: a “braceira”, o “peitoral”, os “safões”, e os “plainitos” - cota e escudo a proteger o corpo do brasido do sol, do afogueamento das “praganas”, e, ainda, os “canudos”, à medida e jeito dos dedos, protegendo-se de algum desvio da foice.

    Com que secreto orgulho e desvanecimento, me revia, frágil criança de 10 anos, nesses instrumentos de trabalho - as primeiras coisas verdadeiramente minhas, feitas à minha medida e para meu uso! Com que íntima satisfação eu passava a minha mão de criança, pelo fio da pequena foice - como o donzel afagaria a espada, em véspera de “torneio” e me imaginava já alinhado no “corte”, entre os homens, cujo vigor e força eu tanto admirava. Eu ouvia falar, com encantamento, dos homens que aguentavam na “braceira”, no braço hercúleo, uma verdadeira paveia de trigo que, ao ser lançada no chão, quase bastava para formar um molho. Ouvira falar desses homens, com o mesmo enlevo, com que os donzéis medievais ouviriam contar as façanhas dos “Cavaleiros” de “Amadis de Gaula”, da “Távola Redonda”.



    Lembro-me como se fosse hoje, não obstante a distância que me separa desse dia, em que, equipado a rigor, saia da minha aldeia, com os companheiros daquela aventura. Lembro o ar superior com que, ao entrar na garganta da “Serra de Alcaravela”, que a ribeira do mesmo nome corta, no Cabril, olhei, a última vez, para trás. Era, realmente, um mundo novo que se me abria.Quinze ou vinte quilómetros vencidos, andados a pé, em festa, e eu chegava ao Rossio de Abrantes onde o comboio, tantas vezes sonhado, quase tantas como o mar, e ainda não visto, me transportaria a Ponte de Sor. Daí, uma nova e não menos longa caminhada, me levaria ao “Monte da Rascôa”, próximo da Vila de Sousel. Dormi e acordei com o sol a levantar-se no horizonte, no lado contrário. Tinham sido voltas a mais, para não me desorientar. Seria aquele dia e os dois de “folga”- “Corpo de Deus” e “S. Pedro” - os únicos em que o sol surpreenderia os ceifeiros a dormir.

    Daí por diante, o horário seria diferente: ao raiar do dia e mal iniciada a madrugada, o “manageiro” bradaria: “Vá lá, arriba, ó família!” Noutras “camaradas”, seria: “Leva, arriba, ó filhos de Deus!”

    E ainda noutras: “Quem tem a devoção de ganhar o seu, venha a mais eu!



    E a “camarada” alinhava no “corte”, sob o comando do “manageiro” e nos lugares previamente estabelecidos, contando com os mais novos, que se intercalavam com os homens, procurando um equilíbrio que pudesse garantir o avanço uniforme da linha da “frente”, sem exigir a ninguém um esforço desproporcionado. E tudo isto com regras de há muito seguidas - era preciso levar as “hombreadas” ou “pancadas”, ao jeito, nunca descendo e, naturalmente, nunca de rosto para o sol, estudando os “talhões”, de modo a tornar o trabalho, o mais possível eficaz e o menos possível oneroso. Só quando o pão (trigo, aveia ou cevada) acamava, a estratégia habitual se alterava, já que a foice só se lhe metia do lado contrário àquele para onde caía.

    Do raiar do dia até ao nascer do sol, aquela “frente” de trinta a quarenta homens e rapazes, aproveitando a “fresca”, deixara já, após si, farta sementeira de “paveias” que alguns dos mais jovens ceifeiros não tardariam a juntar, para formar os molhos, atados com os caules do próprio cereal, se este dava comprimento, ou, caso contrário, com junça, procurada nos lugares frescos das proximidades. Os molhos seriam depois conduzidos para os “rolheiros” ou “rilheiros”, e, por fim, nos carros dos arrieiros, transportados, em geral para o “Monte”, formando a “Meda” grande, designada “fascal” que atingia, por vezes, proporções gigantescas, fazendo lembrar as pirâmides do Egipto.



    Quando o sol desponta, faz-se uma pausa - a única feita na linha do “corte”. O “manageiro” tira o chapéu e brada: “ó pessoal” e em outros casos, “ó família, rezemos um Padre Nosso ao Santíssimo Sacramento!”.

    Este momento era vivido intensamente, em cada manhã. Aqueles homens valentes, aqueles jovens irrequietos, imitando o “o manageiro”, descobrem-se também e concentram-se. O pensamento voa: aldeia distante, família, noiva, Igreja da terra; eu sei lá que de recordações, que de emoções lhes invadem o coração. Por ali, não se via nem Igreja, nem povoado. Era tudo tão distante... Só trigais, “folhas” sem fim, azinheiras e as cotovias - companheiras inseparáveis do ceifeiro, seguindo-o sempre com o seu voo e canto característicos.



    E após aqueles momentos de oração, com o sol a emergir da névoa, habitualmente anunciadora da calmaria ( e que muitas vezes mais parecia a lua cheia), vinha a “bucha”, distribuída e comida ali mesmo, para não se perder tempo. Consistia num “massaquete” - pequeno pão de trigo, ao jeito do “paposeco”, mas um pouco maior.

    Comido num ai, logo recomeçava a faina até ao almoço, servido às sete horas solares e que, invariavelmente, era constituído pela “açorda”.

    Era um rito sempre igual: um “barranhão”, ao jeito das marmitas, para cada seis; pão migado à faca, fatias sobre fatias e depois, água quente com cebola e uma escassa colher de azeite, por cada pessoa.

    Num instante se preparava e num instante se comia o almoça do ceifeiro. Quando terminava e assim se faria depois do jantar, o “manageiro” dizia: “sela louvado Nosso Senhor Jesus Cristo!”. Assim, todos os dias.

    E pegava-se logo no “corte”. Era mais uma arrancada até ao jantar, comido às 12 horas solares.

    Chegara, entretanto o “mantieiro”, trazendo, na mula e em “cangalhas”, (algumas vezes num carro), a sopa de grão ou feijão, invariavelmente, e que, três dias por semana, era de azeite e os outros de carne (toucinho), mais o pão e queijo (meio para cada ceifeiro), a água e os temperos necessários para as refeições frias do dia.

    Recordo-me de que, em geral, os queijos eram guardados para trazer para casa. Aí dariam muito jeito para “conduto” da família, ao longo do ano. Terminado o jantar, vinham as horas da “sésta”, a coincidir com a hora “sexta” da divisão romana do dia, assimilada pela Igreja e que corresponde, precisamente, às doze horas solares.



    Esse descanso tira, assim, o nome da hora em que se goza. E como sabia bem aquele sono reparador, à sombra da azinheira, sempre que por ali houvesse exemplar desta árvore amiga, à hora mais calmosa do dia!

    À voz do “manageiro”: “Água fresca!”, terminava a “sesta” e recomeçava o trabalho até ao cair da tarde.

    Com uma hora de sol, comia-se a “ceia”, neste caso, o “caspacho”, por lá e não só, também chamado “sopa ferial” - de novo em manifesta referência à designação latina com que a Igreja classifica os tempos em festivo e ferial. E era bem “ferial” aquela ceia!

    Com o mesmo respeito pelo “rito”, se tomam os “barranhões”. Agora o pão (dois “massaquetes” por pessoa) não é cortado às fatias, mas migado à mão. Entram no “caspacho”, por cada “barranhão”, para seis comensais, três dentes de alho, uma colher de sal, que se pisa com os dentes de alho, seis colheres de azeite, vinagre e água suficiente, sem esbater o agre do vinagre.

    Com esta refeição fresca, o ceifeiro sentia-se capaz de aguentar o trabalho até à voz da “solta” que, ao apagar-se o “ar do dia”, quando não havia luar, o “manageiro” lançava para a “camarada”, em geito de pregão libertador.

    E os dias eram assim todos iguais, nos horários e nas iguarias. Só o jantar variava, do azeite para a carne e do grão para o feijão.

    Dois dias de folga - e só estes (já que não havia domingos para o ceifeiro), cortavam aquele mês e meio, quando não mais, de duro trabalho. Era empreitada. Daria mais jeito ao patrão. Seria também mais à vontade dos ceifeiros - “ratinhos” da Beira, como por lá os conheciam. Interessava acabar depressa, ganhando quanto possível.

    O processo de retribuição também entrava na “praxe”.

    O “manageiro”, aí por meados de Abril, deslocava-se ao Alentejo, para ver o “pão” que se teria de ceifar. Combinava com o patrão o número de homens com os quais faria a ceifa. O patrão, naturalmente interessado em reduzir esse número e o “manageiro” em o aumentar, já que na paga, o patrão teria de multiplicar este número pela importância estipulada, a nível de região, como “soldada”, para o ano.



    Em 1926, creio que as “soldadas” se fixaram em 400$00. Se o trabalho fosse feito só por homens -.”Camaradas”, cada um receberia 400$00, o que para cerca de 40 dias, equivaleria a 10$00 diários, com a comida à conta do patrão. Na aldeia não havia trabalho e um ou outro dia que se conseguisse, o salário não chegava ainda aos 5$00 e “secos” ou a “seco”, como se dizia. O alqueire de milho orçava então pelos 10$00.



    Entretanto, a verba da “soldada” era acrescida, para os “camaradas”, pelo excedente dos “noveis”, “sobrenoveis” e “cortes”, que ficavam abaixo da “soldada”. A remuneração destes grupos era atribuída, naturalmente, em proporção com o seu trabalho, segundo o juízo do “conselho dos camaradas”, realizado, em geral, nos dois ou três últimos dias da ceifa, após a “solta”.

    Sei que a mim, porventura o mais pequeno “novel”, que terá entrado numa “camarada de ratinhos”, (por vezes tinha que ceifar ao nível da cabeça, prendendo-se com frequência, o chapéu no restolho), me atribuíram 125$00, pelo período da ceifa. Creio que nem descontaram os onze dias que estive com sarampo, curtido, parte, debaixo de uma azinheira e os últimos três dias no “cabanal” do “Monte”, tendo por cama a “manjedoira”. Recordo com gratidão o carinho com que a mulher do “Móral”(de maioral-chefe de abegões e arrieiros) me levava à hora das refeições, o prato de arroz, cozido com abundante toucinho que eu, nas suas costas, repartia com as galinhas e perus que ao “cabanal” acorriam.

    Não mais esquecerei aqueles quarenta dias, vividos numa comunhão de sentimentos e situações, desde o “manageiro”, ao mais pequeno “novel”, em que cada um dava o seu melhor, para maior rendimento daquela dura empreitada. Também, é verdade que se alguém cedesse à mandriice, não tardaria em ver a “horta” talhada à sua frente e a sentir os torrões a cair, desapiedadamente, sobre ele.

    Mas isto só muito excepcionalmente acontecia, porque o espírito competitivo, a ânsia da promoção, o sentido do “torneio” eram estimulantes suficientes para o possível rendimento. Sim, na ceifa, a solidariedade era mais do que uma palavra - era a vida.

    Castelo Branco, 12 - 2 -1980

    ( Transcrito com a devida vénia de SARDOAL COM MEMÓRIA)[/size][/font][/size][/font]
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